O grupo cineclubista 24 Quadros apresenta o filme Full Frontal, de Steven Soderbergh, dentro da mostra dedicada ao cineasta estadunidense neste mês de março. A exibição ocorrerá nessa sexta-feira, 22, às 17h, na sala 4 da Vila das Artes.
Descoberto no final dos anos 1980, com o grande Sexo, Mentiras e Videotape (Sex, Lies and Videotape, EUA, 1989), Steven Soderbergh foi inicialmente adotado como uma espécie de menino prodígio do cinema (afinal, não é qualquer um que, aos 26 anos, arrebata a cobiçada Palma de Ouro do Festival de Cannes e ainda consegue uma indicação ao Oscar), alcançando o feito de realizar uma obra bem-sucedida em termos de crítica e público. Este fato, aliado ao espírito irrequieto do então jovem cineasta, determinou os rumos que sua obra tomaria durante os anos de 1990, onde predominaram películas de caráter alternativo, com quase nenhum sucesso comercial, salvo o morno Irresistível Paixão (Out of Sigth, EUA, 1998).
A virada dos anos 2000 trouxe uma reviravolta na carreira de Soderbergh, com sucessos como Erin Brockovich: uma mulher de talento (Erin Brockovich, 2000) e Traffic: ninguém sai Limpo (Traffic), do mesmo ano, tornando-o num recordista de bilheteria e num sucesso de crítica, com duas indicações ao Oscar de Melhor Direção, obtendo a estatueta com Traffic. No ano seguinte, com 11 Homens e um Segredo (Oceans Eleven, 2001), obteve mais um grande êxito comercial com uma produção bem recebida pela crítica.
Toda essa disgressão histórica faz sentido para entender o contexto no qual se deu a feitura do interessante Full Frontal (Full Frontal, 2002). Às vésperas de lançar outro arrasa-quarteirão, Solaris: onde seus desejos podem se tornar realidade (Solaris, 2002), Steven decidiu realizar uma obra de caráter radicalmente experimental, i.e., o extremo oposto daquilo que ele próprio vinha fazendo no início do novo milênio em Hollywood. E ainda por cima tematizando (ridicularizando) a própria indústria cinematográfica. Talvez por isso Full Frontal (inteiramente de frente, em tradução literal) tenha sido tão mal recebido pelo público à época do seu lançamento e ainda hoje seja uma obra maldita na sua filmografia.
De fato, não é exatamente simples compreender a (s) história (s) dentro do enredo fragmentário, sem nexos aparentes (evidentes), envolvendo personagens que parecem em alguns momentos representarem a si próprios (o galã Brad Pitt de fato faz papel dele mesmo no filme) e brincar de fazer um filme. Imagine então fazê-lo com recursos quase amadores, utilizando câmeras digitais de baixa resolução em boa parte das suas quase duas horas de duração e diálogos improvisados, logo quem havia acabado de receber a maior distinção do mainstream cinematográfico yankee?
Os detalhes da produção podem insinuar um certo caráter irônico do filme. Reunindo um elenco de mega-astros – como Brad Pitt e Julia Roberts – que abriram mão dos cachês milionários e das regalias dos grandes sets de filmagem, rodado em apenas 18 dias e utilizando poucas locações, Full Frontal custou a bagatela (para os padrões americanos) de U$$ 2 milhões. Obviamente, para a indústria cinematográfica, isso é quase uma brincadeira, mas Soderbergh não estava simplesmente tirando sarro e muito menos perdendo tempo. É conhecido que o realizador costuma intercalar obras mais convencionais com outras de tom experimental, cujas conquistas serão incorporadas posteriormente. Foi assim, por exemplo, com Obsessão (The Underneath, 1995), no qual o estudo de cores foi aproveitado em vários trabalhos subsequentes, incluindo o oscarizado Traffic.
Com Full Frontal não foi diferente. Steven queria experimentar as possibilidades dos equipamentos digitais, o que serviu de base para o posterior Bubble, uma Nova Experiência (Bubble, 2005). Não obstante as críticas e o reconhecimento, por parte do próprio diretor, de que aquele foi um filme difícil, em entrevista à The Believer Magazine o mesmo afirma que se eu não tivesse feito Full Frontal eu não teria tido condições de ter feito Bubble do jeito que eu fiz, em termos de controle estético. O que aprendi com Full Frontal foi que você precisa aplicar algumas ideias em algo para torna-las mais claras. Muitas pessoas que escrevem sobre arte não entendem a importância do fracasso, do processo.
Estamos diante, portanto, de um filme cujo processo é o mais importante. É banal, portanto, procurar uma linha narrativa estável ou criticá-lo pelo que ele (não tem) de lógico ou mesmo procurar valorizá-lo pela linha do conteúdo metalinguístico que o mesmo carrega. Full Frontal não é o tipo de filme feito para se distrair numa sala de cinema e nem para fazer pensar. Ele requer outro tipo de público, o que não exclui que o espectador comum possa se divertir com algumas das sequências dos personagens non sense que povoam quiçá a mais polêmica das obras de Soderbergh.
Data de exibição
O filme será exibido nessa sexta-feira, dia 22 de março de 2013, às 17 horas, na sala 4 da Vila das Artes, situada na Rua 24 de Maio, 1121, no Centro de Fortaleza.
Ficha técnica
Full Frontal (EUA, 2002), de Steven Soderbergh. Elenco: Julia Roberts, Brad Pitt, David Duchovny, Nicky Katt, Catherine Keener, Mary McCormack, David Hyde Pierce. Tempo de duração: 111 min
Confira o trailer de Full Frontal.
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